QUIXADÁ: A GATA BORRALHEIRA CEARENSE
Quixadá é uma cidade
belíssima! Mas não é porque suas ruas sejam agradáveis de se ver,
nem porque tenha excelentes níveis de organização e ofereça um
alto padrão de qualidade de vida, muito menos porque mantenha um
belo conjunto arquitetônico que remonte às origens no século XIX.
Nada disso. É bela porque se desenvolveu em um lugar de beleza
única, coisa que seus fundadores perceberam cedo e, se tivessem tido
tempo, teriam feito da cidade um grande polo turístico. Três das
maiores empreitadas arquitetônicas da cidade foram erigidas antes
dos anos 1930, numa época de muito mais dificuldades do que hoje,
que são o Cedro, o Chalé e o Cruzeiro no alto da Pedra. De lá pra
cá, o que mais de grandioso se fez pela cidade? Nada! Excetuando-se
o magnífico Santuário, que foi ideia de um estrangeiro e fica fora
da área urbana, o que se viu ao longo da história quixadaense foi
uma sequência de demolições e descuido do patrimônio, que inclui
a derrubada da antiga prefeitura e, recentemente, de um prédio
histórico em frente à praça principal, sem contar a implantação
de antenas ao lado do cruzeiro (que está prestes a ruir por falta de
cuidados) e a fixação de um letreiro de propaganda, ainda nos anos
1970, que induzia o povo a beber cerveja (Para quem não se tocou, em
dois pontos da Pedra, foi afixado um letreiro, à moda do de
Hollywood, que dizia: "Brahma? Amélio Gomes Rolim" -
partes da propaganda ainda estão lá, como se fosse o nome da Pedra
ou mesmo da cidade! Um absurdo que deixaram passar!).
Há quixadaense que
bate no peito e diz que mora numa cidade turística. Engano! Nunca
foi! Em uma cidade turística, há, pelo menos, uma secretaria do
turismo que gerencia os pontos, com serviços organizados para
atender os visitantes, há um programa de arrecadação de renda
gerado pela visitação dos turistas, há guias, há zelo, há uma
otimização constante dos pontos... Não é o que se vê em Quixadá.
Muito pelo contrário!
O caso do histórico açude Cedro prescinde aqui de comentários.
Pensemos na Pedra. Uma maravilha a céu aberto, da qual se pode ver
toda a cidade e grande parte do sertão a sua volta. Contam-se nos
dedos as cidades que têm um mirante natural como esse. Mas é um
ponto completamente abandonado: sobe-se e desce-se à hora que se
quer, para se fazer o que se quer, portando o que se quer! Ponto de
consumo de bebidas, drogas e prática do sexo (explícito em alguns
casos), no local já houve assassinatos e tentativas de suicídio (só
em 2012 foram duas, uma bem sucedida!). De minha casa, que fica
próxima ao monólito, ouvem-se os palavrões e os gritos dos garotos
que sobem ali só para extravasar seus demônios! Até um culto à
meia-noite em torno de uma fogueira acesa depois da janelinha,
entoado por um coro de fanáticos acordando toda a vizinhança já
aconteceu! (Nada contra os cultos, mas à meia-noite, incomodando
quem dorme é demais!). Não há nenhuma construção lá em cima,
nem lá em baixo, onde o turista possa sentar-se à sombra e admirar
a paisagem. As visitas deveriam ser agendadas, grupais e acompanhadas
por um guia. Isso parece tolher o direito de ir e vir, mas evitaria
os excessos, os crimes e as mortes. É assim em qualquer ponto
turístico semelhante. Ninguém sobe e desce no Pão de Açúcar sem
antes passar por procedimentos preventivos!
Quixadá não é uma
cidade turística, apenas tem um grande potencial para sê-lo. Um
potencial que tem sido, ao longo dos anos, cada vez mais
negligenciado. Em vez de pensarem no progresso da cidade e na
melhoria da qualidade de vida dos habitantes, os que chegam ao poder
só pensam em si e no engrandecimento de seu patrimônio particular.
É escândalo atrás de escândalo, enquanto a cidade vai, aos poucos
(mais nem tanto) ficando pior, sem memória, sem beleza e sem
respeito, igual à Gata Borralheira antes de ser enfim descoberta e
valorizada por quem a ama.
SOBRE O AUTOR
Jards Nobre
Professor e Escritor
Membro da Academia Quixadaense de Letras
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